Pela Equipe Editorial, Florida Review
Uma conversa sobre estratégia, valores e o papel do economista no mundo real.
1. Para começarmos, você tem uma carreira multifacetada como economista, consultor de investimentos e autor. Como você definiria sua trajetória profissional até aqui?
Minha trajetória profissional até aqui tem sido voltada para pessoas – seja na consultoria de investimentos – seja nos livros que escrevi ou mesmo nas empresas em que eu trabalhei. Ou seja, minha atuação no âmbito econômico ou no viés mais comportamental (que é uma área da economia) tem a ver com a melhoria do bem estar de um indivíduo ou grupo de indivíduos.
2. Seu trabalho na Cedae durou mais de uma década. Quais foram os maiores aprendizados e realizações que você carrega desse período no setor público?
Trabalhar no setor público, como na Cedae – uma companhia estadual – trazia consigo uma grande rigidez e dificuldade para mudar os processos internos. Isso exigia muita persistência de quem desejava promover mudanças. Aos poucos, percebemos que, com esforço contínuo, era possível mudar algumas coisas – não tudo, claro. Mas mesmo pequenas mudanças, ao longo do tempo, influenciavam outras pessoas a trabalharem melhor. Isso criava um efeito cascata, capaz de melhorar o ambiente, os órgãos públicos e até mesmo a cidade.
3. Sabemos que você participou de projetos estratégicos envolvendo investimentos públicos e reestruturação administrativa. Pode nos contar um pouco sobre essas iniciativas e seus impactos?
Quando se trata de projetos estratégicos envolvendo investimento público, especialmente em uma companhia como a Cedae — que, apesar de ser pública, também visa ao lucro — é fundamental manter um equilíbrio delicado: gerar resultados financeiros e, ao mesmo tempo, garantir o atendimento a áreas que muitas vezes não têm condições de arcar com os custos dos serviços prestados. Nesse contexto, a correta análise de investimentos é essencial para sustentar esse equilíbrio entre viabilidade econômica e responsabilidade social.
Por outro lado, a reestruturação administrativa foi um passo fundamental para melhorar a qualidade do ambiente de trabalho e a satisfação interna. Esse movimento, já implementado com sucesso em algumas poucas empresas do setor em outros estados, mostra que, ao fortalecer o ambiente interno, criamos as bases para uma companhia mais eficiente e, consequentemente, mais capaz de prestar um serviço de qualidade à sociedade.
4. Quais foram suas contribuições originais para o modelo de gestão da Cedae ao tentar adaptá-la ao benchmark da Sabesp?
Acredito que a forte ênfase em treinamento, amplamente adotada pela Sabesp — uma companhia de capital aberto e, portanto, com elevado nível de transparência em sua gestão — foi o que me inspirou a introduzir, de forma gradual e crescente, a cultura de treinamentos em diversas áreas da Cedae.
5. Um ponto marcante do seu currículo é o foco em eficiência e redução de custos com visão social. Como você equilibra o olhar técnico com o impacto na vida da população?
O olhar técnico e focado na eficiência em uma companhia pública tem um impacto quase imediato na vida da população. Quanto melhor uma empresa funciona, seja ela pública ou privada, melhor será o atendimento ao seu público-alvo. Portanto, essas duas variáveis caminham juntas, sem nunca serem excludentes.
6. Você também se envolveu com treinamentos internos e liderança de equipes. Como essa atuação te transformou profissionalmente?
Atuar com treinamento interno e liderança de equipes me transformou profundamente, especialmente pela enorme satisfação de acompanhar o crescimento de quem está sendo treinado — seja no desenvolvimento de hard skills ou soft skills. É uma realização pessoal e profissional ver alguém, de fato, evoluir e se desenvolver dentro da empresa.
7. Ao longo de sua carreira, você teve contato com modelos de excelência em empresas como Sabesp, Copasa e Sanepar. Como essas trocas de experiência contribuíram para sua atuação?
O impacto de grandes empresas como a Sabesp, COPASA e Sanepar evidencia que o crescimento dos funcionários — em termos de eficiência e desenvolvimento profissional — está diretamente ligado ao investimento em treinamento. Empresas de excelência, como essas, reconhecem que capacitação é fundamental, e isso transformou minha percepção dentro da Cedae. Foi justamente por esse motivo que comecei a me aproximar da área de RH e treinamentos, entendendo a importância de contar com um time cada vez mais qualificado dentro da companhia.
8. Na V2W Solution, você liderou vendas para grandes empresas do setor de petróleo. Poderia quantificar o impacto econômico dessas negociações e como suas estratégias comerciais se destacaram no mercado?
O impacto econômico das negociações com grandes empresas resultava em vendas que variavam de R$ 50.000 a R$ 200.000. A estratégia comercial da V2W, que a diferenciava das demais empresas do mercado, era a busca constante e estratégica para antecipar onde um cliente iria construir uma nova instalação, seja uma sede ou um novo prédio. Isso era possível por meio de um extenso networking, com dirigentes de empresas ou pessoas ligadas a elas. Essa capacidade de antecipação nos proporcionava uma vantagem competitiva significativa.
9. Como sua análise econômica contribuiu para o sucesso comercial da V2W em licitações públicas, especialmente com a Petrobras? Houve algum caso particular de inovação em sua abordagem?
O sucesso da V2W em várias licitações públicas se devia a uma análise econômica estratégica, que nos permitia avaliar quando realmente valia a pena participar de uma licitação. Sempre que decidíamos participar, fazíamos isso com uma alta probabilidade de vitória, oferecendo preços altamente competitivos, além de realizar uma análise detalhada dos concorrentes prováveis. No caso específico da Petrobras, contamos com um histórico sólido de aquisições realizadas por meio de licitações anteriores da companhia, o que nos proporcionava uma vantagem competitiva.
10. Além do trabalho como economista, você se destacou como autor e palestrante na área de desenvolvimento pessoal. Como nasceu esse interesse?
A economia, na verdade, é uma ciência social — embora muitas pessoas acreditem que se trata de uma área puramente de exatas. Um bom exemplo disso é o trabalho de Daniel Kahneman, um dos pais da economia comportamental, que explora profundamente as conexões entre psicologia e decisões econômicas. Isso mostra como o desenvolvimento pessoal está diretamente ligado ao bem-estar e à maturidade individual. E esse amadurecimento naturalmente se reflete em atitudes mais conscientes na hora de investir e, consequentemente, no crescimento pessoal.
Tudo está interligado: economia, hábitos e comportamentos — fatores que influenciam diretamente nossas decisões econômicas e o nosso bem-estar. Falo isso com base na minha própria trajetória e nas reflexões que faço sobre o que eu teria feito de forma diferente quando mais jovem. São, de certa forma, conselhos que hoje daria a mim mesmo.
11. Seu blog “Hábito Bom” teve um grande alcance por vários anos. Qual era a proposta do conteúdo e como você enxerga o impacto que gerou nos leitores?
O blog Hábito Bom tinha justamente o objetivo de promover o crescimento pessoal. Ele reunia diversos artigos sobre minimalismo e sobre como agir no médio e longo prazo para desenvolver hábitos melhores. A proposta central era a melhoria contínua dos hábitos — porque, ao evoluir como pessoa, também passamos a tomar decisões mais conscientes em relação ao dinheiro e aos investimentos. Não se tratava de enriquecer, mas de aprender a gerenciar bem o que se tem e crescer de forma pessoal e profissional, alocando da melhor maneira possível todos os recursos — financeiros ou não — que estão ao nosso alcance.
12. Como autor de livros digitais sobre autoconhecimento, liderança e finanças pessoais, qual dessas obras você acredita que teve maior repercussão ou significado pessoal?
Na minha opinião, o livro que teve maior significado pessoal foi Habilidades para a Vida (Skills for Life). Ele trata justamente das competências que precisamos desenvolver — especialmente as chamadas soft skills — para alcançarmos sucesso em diversas áreas da vida. Além disso, destaca a importância de saber lidar bem com o dinheiro, independentemente da idade: aos 30, aos 40 e, principalmente, na velhice.
13. Mais recentemente, você atuou como consultor de investimentos para famílias de alto poder aquisitivo. Quais os principais desafios e recompensas desse trabalho?
Atuar como consultor de investimentos é uma responsabilidade muito séria, pois lidamos diretamente com o bem-estar financeiro dos clientes. Embora sejamos remunerados por isso, o compromisso vai muito além. Um dos maiores desafios da profissão surge quando lidamos com famílias compostas por diferentes gerações. A geração mais velha tende a ser mais conservadora em relação aos investimentos, enquanto a mais nova, muitas vezes, busca estratégias mais arrojadas. Quando trabalhamos com a geração mais velha, precisamos considerar não apenas os investimentos em si, mas também o legado que essa pessoa deseja deixar.
Outro desafio importante é apresentar com clareza a real situação dos investimentos — especialmente quando falamos do mercado de ações, com seus riscos e a paciência necessária para obter bons resultados. Quando um investimento começa a desvalorizar, é comum que o cliente entre em estado de alerta ou até desespero. Nesses momentos, cabe a nós tranquilizá-lo e mostrar que oscilações são parte natural do processo. Por isso, paciência e habilidade de comunicação são tão essenciais quanto o conhecimento técnico.
Quanto às recompensas da profissão, eu diria que a principal é ver a tranquilidade e o reconhecimento do cliente quando realizamos um bom trabalho, além da confiança que conquistamos em uma área tão sensível como o dinheiro. Outro retorno valioso é a indicação para novos clientes e, muitas vezes, o amadurecimento financeiro que percebemos em quem acompanhamos. E, claro, há também a recompensa financeira, que é resultado desse trabalho bem-feito.
14. Em sua visão, qual é o maior legado que você deseja deixar como profissional e como pessoa?
O legado que desejo deixar, tanto como profissional quanto como pessoa, está profundamente ligado ao crescimento pessoal dos outros. Para mim, questões como desenvolvimento pessoal, profissional e a forma de lidar com o dinheiro estão todas conectadas. Por isso, quando vejo um cliente evoluindo nessas áreas, sinto uma satisfação imensa. É claro que tenho planos — quero me envolver com projetos sociais no futuro — mas vejo isso como uma nova etapa da minha trajetória profissional. Acima de tudo, quero ser lembrado como alguém que contribuiu positivamente na vida das pessoas, que ajudou outros a alcançar sucesso, satisfação ou crescimento, seja por algo que eu tenha feito, escrito ou falado.
15. E olhando para o futuro, que projetos ainda gostaria de realizar ou tirar do papel?
Um projeto que desejo tirar do papel está relacionado ao desenvolvimento do pensamento econômico das famílias, de forma mais profunda e reflexiva. Já pensando no médio e longo prazos — nos próximos cinco, dez anos ou mais — reflito bastante sobre atuar na área social, por meio de uma ONG. Isso pode acontecer em paralelo a uma atividade profissional remunerada ou mesmo como função principal. É algo que só o tempo dirá.
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Bruno Wagner é economista formado pela PUC-RJ, com mais de 20 anos de experiência em gestão pública e privada. Atuou como líder na CEDAE, promovendo avanços significativos em saneamento básico, gestão de pessoas e planejamento estratégico. Consultor de investimentos e autor de livros sobre finanças e desenvolvimento pessoal, também é criador do blog HabitoBom.com.br.